Uma tragédia anunciada

Relutei muito em fazer essa postagem, face a possibilidade de uma grande repercussão, no entanto, decidi fazê-lo por achar que as consequências seriam suplantadas pelo benefício à engenharia, que é a minha busca incessante durante esses meus anos profissionais, as pessoas que me conhecem de perto podem atestar isso. Essa é uma situação muito importante pra a engenharia brasileira porque, talvez esta tenha sido a primeira vez, que um sinistro grave tenha ocorrido com conhecimento prévio.

Há três semanas, fui convidado a realizar uma avaliação em uma obra que apresentava sinais de manifestações patológicas graves. Essa edificação entrou em colapso, e vou tentar transmitir e comentar o que pude observar in loco, de maneira estritamente técnica.

A edificação, no momento da visita, possuía cinco lajes, e estava sendo construída como um anexo de outra edificação. Quando cheguei na obra, percebi que, a junta de dilatação estrutural que separava as duas edificações estava mais estreita na parte inferior que na parte superior, parecendo possuir nessa, uns 10cm. Um indício de recalque diferencial das fundações. O que parecia estranho era o sentido desse deslocamento, devido à possibilidade do incremento do bulbo de tensões no solo na região dos pilares do prédio existente.

Quando adentrei, fui direto na região dos pilares que poderiam estar sob recalque, percebi uma fissura sui generis em uma parede apoiada, de um lado no muro periférico e do outro, numa parede que talvez pudesse estar apoiada numa viga “baldrame” (Foto 1).

FOTO 1

Ainda nesse pavimento, busquei, nos pilares, por sinais de esmagamento de concreto, flambagem local das armaduras, ou fissuras de flexão, mas não haviam. No pavimento superior, vi que existia uma laje em balanço que fazia o contato com o prédio vizinho, essa laje estava rampada na direção da edificação vizinha (Foto 2). Como as edificações iriam ser integradas, imaginei que o problema fosse de nível entre as lajes, a estrutura nova teria sido construída numa cota mais elevada que a antiga. Pensei: foi incrementado o momento negativo desse balanço. Nos pavimentos superiores existiam esse mesmo problema, ora em maior grau, ora em menor.

FOTO 2

Uma tentativa de reforço

Em uma laje periférica na parte posterior da obra, pude verificar as paredes da periferia da edificação em sua face norte, e vi que alguns pilares estavam desaprumados ou locados com elevada excentricidade (Fotos 3 e 4). Também percebi, que apesar das alvenarias serem executadas em tijolos cerâmicos de vedação, alguns panos foram preenchidos por um material cimentício com forma, a estilo de uma parede de concreto moldado in loco, para minimizar os desaprumos, o que ainda poderia aumentar o carregamento na estrutura (Fotos 3 e 4).

Subindo mais, percebi, no 3º pavimento, que uma viga possuía sinais claros de deficiência ao cortante, com fissuras de enorme abertura, inclinadas junto ao pilar e ainda fissuras decorrentes de deficiência de capacidade à flexão (momento positivo), achei estranho, porque essas últimas não estavam localizadas no meio do vão mas, deslocadas uns 50cm a 60cm. Fui ao pavimento mais acima pra ver se descobria o porquê do deslocamento do momento. Percebi, que o trecho desse pilar no pavimento acima, estava deslocado, apoiado na viga que apresentava as fissuras, aí entendi o deslocamento do momento máximo. Fiquei muito preocupado com esse fato, já que esse não era o último pavimento, e se essa viga entrasse em colapso, os pavimentos superiores poder im ruir sobre os pavimentos inferiores e o colapso progressivo da estrutura ocorrer. Estribo rompido, tentativa de reforço,

Fábio Giovanni

Engenheiro civil formado pela Universidade Federal da Paraíba, Membro do IBRACON, Alconpat e ACI, publicou vários trabalhos científicos em congressos e simpósios nacionais e internacionais, na área de construção de edifícios, gestão e gerenciamento da construção civil e patologia das estruturas.

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O recente terremoto que atingiu a Síria e a Turquia, causando um grande número de mortes, ganhou destaque em todo o mundo, incluindo o Brasil, especialmente entre os engenheiros. Eventos sísmicos como esse, despertam a atenção de profissionais que trabalham na área da engenharia estrutural, pois podem causar consequências graves para as edificações, além de perdas humanas e econômicas significativas. E no Brasil, será que haveria a necessidade de preocupação com terremotos ou ventos de alta velocidade? Antes de responder a essa pergunta, é importante explorar um pouco mais sobre o assunto. Nesse primeiro texto, será abordado a ação do Vento, sendo este uma das portas de entrada para a compreensão do comportamento dinâmico das estruturas. O Vento A disciplina que trata de ações que produzem vibrações nas estruturas é denominada de Análise Dinâmica. Geralmente, este assunto não está inserido na grade curricular dos cursos de Engenharia Civil, sendo abordado em programas de pós-graduação. Conceitos Básicos da Dinâmica das Estruturas de Edifícios Um problema de dinâmica estrutural difere de seu equivalente estático em dois importantes aspectos: o primeiro é a variação temporal, isto é, o carregamento e a resposta dinâmica variam com o tempo, o segundo trata-se do surgimento de forças inerciais, associadas às acelerações, forças de dissipação, usualmente associadas às velocidades.  As equações de movimento de um sistema podem ser obtidas utilizando o princípio de D’Alambert, que estabelece um equilíbrio dos esforços resistentes, de inércia, de amortecimento e do esforço externo aplicado para os graus de liberdade da estrutura. As equações diferencias do movimento são: Nota-se que a parcela estática ensinada na graduação em engenharia civil é; ku=F, sendo “F” as forças externas estáticas. Para resolver o sistema de equações diferenciais supramencionado emprega-se o modelo massa-mola, conforme a figura abaixo: que faz analogia ao sistema estrutural: A resolução dessa

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Técnica de injeção de fissuras

Em virtude da última postagem, recebi muitas mensagens pelo direct solicitando maiores explicações sobre a tecnologia de injeção de fissuras nas estruturas de concreto armado. Então, farei esta postagem pra explicar um pouco melhor.   A técnica consiste basicamente em se aplicar os bicos de injeção, ora em furos realizados com brocas de diâmetro específico, ora aderidos sobre a superfície do concreto, espaçados estrategicamente no caminho (path) da fissura; vedar a fissura ou quaisquer outros vazios que possam estar conectados com as fissuras na região entre bicos (ou próximos deles) com uma resina tixotrópica, geralmente a epoxídica; aplicar (injetar) nos bicos, uma resina mais fluida, ou até materiais inorgânicos; escolher uma direção de aplicação mais adequada ao material adotado e mais adequada em função do grau de preenchimento da fissura que se deseje. (a) (b) (c) Fig. 1 – Detalhe da sequência de atividades (a) realização dos furos; (b) aplicação dos bicos de perfuração; (c) colmatação das fissuras com resina tixotrópica   Existem duas situações gerais em que a injeção é adotada como forma de recuperação. A primeira ocorre quando é necessário colmatar uma fissura que esteja submetida a um fluxo de algum fluido, ou esteja na possibilidade de ocorrer (em muros de arrimo ou contenções em contato com água). Nessas situações, é mais indicado a utilização de selantes como material de injeção, as resinas acrílicas e poliuretânicas e/ou a resinas poliuretânicas hidro expansivas. Caso o fluxo seja atual e contínuo, primeiramente, injeta-se a resina hidro expansiva e depois o selante de poliuretano. Nessas situações as fissuras podem possuir causa ainda ativa, ou seja, fissuras cuja causa ainda não foi sanada. Na segunda situação, o objetivo é reestabelecer a monoliticidade do elemento estrutural, de modo que as transferência de carregamento ocorra normalmente e a rigidez do elemento estrutural seja reestabelecida.

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Arquitetos Importantes

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